O desfecho foi parecido: soldados numa elevação hasteando a bandeira nacional. Mas, talvez parem aí as semelhanças da Batalha de Iwo Jima, no Pacífico, em 1945, com a Batalha do Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, em 2010.
Em 25 de novembro de 2010, após uma semana de ataques esporádicos de facções criminosas, com bloqueios em ruas, incêndios ateados em ônibus e automóveis particulares, e tiros contra cabines policiais, uma poderosa força composta de membros do Batalhão de Operações Especiais (BOPE) da Polícia Militar e da Coordenadoria de Recursos Especiais (CORE)da Polícia Civil, empregando meia dúzia de blindados de assalto M-113 da Marinha do Brasil operados por fuzileiros navais, invadiu a favela de Vila Cruzeiro, enclave intocável dos traficantes de drogas durante vários anos de governos omissos, acordos sujos, populismo e demagogia.
Os costumeiros bloqueios usados pelos bandidos para obstruir as ruas de acesso às favelas não funcionaram contra os potentes e blindados veículos, dotados de lagartas ao invés de pneus. Caminhões atravessados na rua foram afastados do caminho com facilidade pelos tanques navais.
O helicóptero de uma emissora de TV mostrou então um dos espetáculos mais insólitos já vistos nos últimos tempos: pelos fundos da favela, numa passagem em torno de um morro que leva ao vizinho complexo de favelas do Alemão, começou o desfile de mais de 200 bandidos, carregando armas de guerra e bolsas com munições, como uma bando de baratas fugindo de uma fossa dedetizada. Um franco atirador da polícia, bem postado, ainda disparou duas ou três vezes, acertando pelo menos dois marginais, que tombaram feridos. Mas, deve ter interrompido os tiros ao ser informado de que tudo estava sendo mostrado ao vivo pela camera no helicóptero. As entidades protetoras dos bandidos não iriam tolerar que os pobres marginais armados fossem alvejados assim.
Os marginais restantes abandonaram a estradinha e se dispuseram a atravessar o morro varando o mato baixo, e chegaram ao Complexo do Alemão.
Assim, os homens da força mista entraram na Vila Cruzeiro praticamente sem resistência e ocuparam a comunidade.
Enquanto isto, chefões que comandaram os atentados de dentro dos presídios eram rápida e prontamente transferidos por ordem judicial para presídios de segurança máxima em outros estados. Também eram suspensas algumas regalias concedidas oficialmente a criminosos de alta periculosidade, como visitas quase ilimitadas de advogados e visítas íntimas de suas mulheres. E finalmente, a prisão de advogados de traficantes, acusados de servirem de estafetas para transmitir ordens dos seus clientes presos para as quadrilhas executarem os ataques terroristas.
Certas emissoras de TV, sempre prontas a denunciarem a dureza da polícia em ações nas chamadas comunidades, desta vez aprovaram tudo o que estava sendo feito, admitindo ser necessário, apesar dos transtornos para a população do local. E fica a pergunta: como de uma hora para outra se fizeram coisas que precisavam ser feitas há tanto tempo?
Talvez por um erro fatal cometido pelos marginais. Os traficantes ficaram aborrecidos com a implantação das chamadas UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora) em morros e favelas cariocas. A presença constante da polícia nas redondezas, interagindo com as associações de moradores e líderes religiosos locais, além de ocupar o espaço político dos traficantes, fez cair movimento dos pontos de venda de drogas, afugentando os usuários e causando grandes prejuízos aos "negócios". Esperavam que, após as eleições, as coisas fossem afrouxando e as UPPs fossem aos poucos sendo neutralizadas. Como viram que isto não aconteceu, resolveram partir para a intimidação. Facções criminosas até então adversárias se uniram e seus chefes, mesmo confinados em presídios, orquestraram atentados, distribuídos como "dever de casa" para cada favela sob o seu domínio. Como a cidade é praticamente toda cortada por favelas, seria possível semear o caos em doses aleatórias, tornando difícil o trabalho da polícia. Mas, suas ligações com o exterior dos presídios estavam sendo monitoradas e, no presídio de Cantanduva, no Paraná, em cartas de presidiários interceptadas foram encontradas instruções para sabotar o ato de criação de uma UPP, possivelmente no Complexo do Alemão, além de outros atos de terrorismo urbano capazes de prejudicar por tabela eventos como a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016! Aí, o seu grande erro! Ao fazer isto, mexeram com pessoas e entidades que planejam faturar milhões com estes eventos, desde empreiteiras e políticos até aos gigantes da mídia televisiva!
Meu palpite é de que foi isto que causou esta súbita mudança de atitude, que a TV quer nos convencer de que foi uma "conscientização coletiva da população", quando na verdade foi obra de poucas mas poderosas pessoas e entidades que não admitem que seus interesses sejam prejudicados! Ainda bem que, neste caso, isto ainda pode ser útil também para o povo.
Soldados americanos hasteiam a bandeira em Iwo Jima, em 1945
Policiais do CORE hasteiam a bandeira no Morro do Alemão, em 2010
(Foto: Jornal Extra - Rio)
Mas, os bandidos, acuados, estavam no grande Complexo do Alemão. Agora com ajuda mais acentuada das forças armadas, começou o cerco à comunidade, bem maior do que a de Vila Cruzeiro. A segurança do perímetro ficou ao cargo de aprox. 800 homens da Brigada Paraquedista do Exército, e com mais carros de combate do exército, além dos da Marinha já presentes no local. A Polícia Federal também se envolveu, e a Força Aérea contribuiu com helicópteros Super Puma para cobertura aérea. Às 08:00 h de domingo, com a chegada de um helicóptero blindado da PM, começou a invasão do Complexo do Alemão. Mas, a resistência novamente foi bem menor do que o esperado. Apesar de alguns tiros disparados a esmo pelos bandidos, logo as forças policiais chegaram ao centro do complexo e asseguraram o domínio da comunidade. Alguns bandidos foram feridos e presos em escaramuças, outros se entregaram, mas aqueles mais de 200 que vieram da Vila Cruzeiro e os tantos outros que devem existir no próprio complexo não apareceram. Ou escaparam, furando o bloqueio dos paraquedistas, o que é difícil para tantos homens, ou continuam lá, escondidos entre os moradores locais, como hóspedes não convidados.
Num prédio mais elevado, foram espetadas as bandeiras do Brasil e do Rio de Janeiro, como foi feito em Iwo Jima com a bandeira americana, enquanto ainda haviam japoneses enfiados nas cavernas da ilha.
Esperemos os próximos atos desta epopéia.
Só o futuro dirá se a data de 25 de novembro será o marco de uma virada na história desta cidade...
Só o futuro dirá se a data de 25 de novembro será o marco de uma virada na história desta cidade...