Quilombo era o nome genérico dado à comunidades marginais formadas no Brasil colonial por escravos que logravam escapar das fazendas e engenhos onde serviam como mão-de-obra. Os quilombos de que se tem conhecimento eram na maioria situados no Nordeste.
O maior de todos foi o Quilombo dos Palmares, situado na serra da Barriga, no atual estado de Alagoas. Este povoamento existiu por mais de um século.
No fim do século XVI, as aldeias que formavam Palmares ocupavam uma área de palmeirais que se estendia do cabo de Santo Agostinho, em Pernambuco, até a atual cidade de Penedo, às margens do Rio S. Francisco, no estado de Alagoas.
Por ocasião das invasões holandesas do Brasil (1624-1625 e 1630-1654), muitos proprietários de terras fugiram de suas propriedades, e os escravos aproveitaram para buscar também refúgio, não dos holandeses, mas de seus próprios senhores.
Em consequência disto, registrou-se um crescimento da população em Palmares, que passou a formar diversos núcleos de povoamento, chamados mocambos. Os principais foram:
Macaco, espécie de capital do quilombo, com cerca de 1.500 casas;
Subupira, que era o centro das atividades militares, com cerca de 800 casas;
Zumbi e Tabocas eram aldeias menores.
Historiadores estimam que, em 1670, a população local era de cerca de vinte mil pessoas.
Essa população sobrevivia graças à caça, à pesca e à agricultura. Também, havia o artesanato para consumo local: (cestas, tecidos, cerâmica, metalurgia). Os excedentes eram comercializados com as populações vizinhas, de tal forma que colonos chegavam a arrendar terras para plantio e a trocar alimentos por munição com os quilombolas. Portanto, havia um fluente intercâmbio comercial entre o quilombo e as povoações vizinhas.
Pouco se sabe sobre a organização política no quilombo. Alguns historiadores afirmam que se constituiu ali um verdadeiro estado, nos moldes dos reinos africanos, sendo os diversos mocambos governados por oligarcas sob a chefia suprema de um líder.
Outros historiadores apontam para a possibilidade de uma descentralização do poder entre os diferentes grupos, pertencentes à diversas etnias que formavam os núcleos de quilombos, que delegariam esse poder a lideranças militares, conforme o seu prestígio. As lideranças mais notáveis foram Ganga Zumba e seu sobrinho, Zumbi. Como de costume na África, havia a discriminação entre as tribos e a prática da escravidão.
Com a expulsão dos holandeses do nordeste do Brasil, voltaram os senhores de terras a ocupar suas propriedades originais, e houve a retomada de produção dos engenhos de açúcar da região. Dado o elevado preço de novos escravos africanos, o governo colonial foi pressionado pelos senhores de engenho a atacar Palmares, visando a recaptura de seus integrantes.
Em carta à Coroa Portuguesa, um Governador-geral reportou que os quilombos eram mais difíceis de vencer do que os holandeses.
Foram necessárias, ao todo, cerca de dezoito expedições, organizadas desde o período de dominação holandesa, para erradicar definitivamente o Quilombo dos Palmares.
No último quarto do século XVII, o líder do quilombo era um rei chamado Ganazumba, que no dialeto kimbundu significa "grande senhor". Mas entre os portugueses, acabou virando "Ganga Zumba". Ganga Zumba tinha as prerrogativas de um verdadeiro rei africano, com toda uma infraestrutura de apoio e criadagem inerentes ao seu cargo. Em 1677, Fernão Carrilho, enviado pelo governador de Pernambuco, ofereceu a Ganga Zumba um tratado de paz, que na verdade era bem desvantajoso para os quilombolas. Por seus termos, era oferecida a liberdade aos nascidos no quilombo, assim como terras inférteis na região de Cocaú, desde que passassem a ser devolvidos os escravos fugitivos que procurassem refúgio na comunidade. Este acordo na realidade não fora autorizado pelo governador, e sim proposto por iniciativa de Carrilho. Mas, foi aceito por Ganga Zumba, que chegou a enviar seus três filhos e doze de seus chefes menores ao Recife, onde foi feita a celebração. Porém, na realidade, a maioria dos quilombolas rejeitou os termos desse acordo, inclusive porque tirava a chance de fuga de parentes ainda escravizados. Houve forte dissidência e Ganga Zumba foi envenenado, subindo ao poder o seu irmão, Ganga Zona, moderado e aliado dos portugueses. O acordo foi rompido, e os os dissidentes acabaram dando um golpe e assumindo o poder em Palmares, colocando no trono Zumbi, filho de Ganga Zona.
Zumbi fora capturado ainda menino, durante uma incursão de Brás Rocha Cardoso contra o quilombo, e entregue ao padre católico Antonio Mello, que o batizou com o nome cristão de Francisco. Ele foi criado, alfabetizado e educado na paróquia de Porto Calvo, aprendendo inclusive latim, e tornou-se coroinha nos serviços religiosos.
Mas, com pouco mais de 15 anos, fugiu e retornou à suas origens, reencontrando seus parentes no quilombo. Lá, logo se destacou pela sua iniciativa e por seus conhecimentos, acabando por liderar os dissidentes que derrubaram seu pai.
No primeiro momento, Zumbi substituiu a estratégia de defesa passiva pela guerrilha, com a prática de ataques de surpresa a engenhos, libertando escravos e apoderando-se de armas, munições e suprimentos.
Após várias investidas infrutíferas contra Palmares, o governador e Capitão-general da capitania de Pernambuco, Caetano de Melo e Castro, contratou o bandeirante Domingos Jorge Velho e o Capitão-mor Bernardo Vieira de Melo para erradicar de vez a ameaça dos escravos fugitivos na região.
O quilombo passou a ser atacado pelos bandeirantes que, mesmo experientes na guerra de extermínio contra os índios, tiveram grande dificuldade em vencer as táticas dos quilombolas, melhor organizados que os indígenas. Além disso, não foram bem recebidos pelos colonos da região, vítimas de saques dos bandeirantes em diversas ocasiões.
Em janeiro de 1694, após um ataque frustrado, as forças dos bandeirantes iniciaram uma campanha vitoriosa, com um efetivo de seis mil homens bem armados, apoiados inclusive com artilharia.
Um quilombola, Antônio Soares, foi capturado e torturado, até que, mediante a promessa de Domingos Jorge Velho de que seria libertado, revelou o esconderijo do líder.
Zumbi foi finalmente encurralado e morto em uma emboscada, em 20 de novembro de 1695.
A cabeça de Zumbi foi cortada e conduzida para Recife, onde foi exposta em praça pública, no alto de um mastro, para intimidar os escravos que pretendessem fugir.
Sem a liderança militar de Zumbi, o quilombo se desfez, no ano de 1710.
Entretanto, sobreviventes se reuniram em comunidades menores e mais discretas, e algumas delas existem até hoje, habitadas por descendentes dos quilombolas originais. Cajá dos Negros, no município de Batalha, no estado de Alagoas, é uma delas.
A constituição brasileira de 1988 estabeleceu, no seu artigo 68, Título X, que tais descendentes tem o direito de posse das terras que ocupam, nos seguintes termos:
TÍTULO X
ATO DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS
Art. 68. Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos.
É interessante notar que:
Mesmo nos quilombos, havia a prática da escravidão de membros de etnias diferentes, costume trazido da África, onde até hoje ainda há hostilidade entre tribos.
Ao contrário do que diziam lendas antigas, Zumbi nunca foi escravo, nem se suicidou, mas nasceu livre e foi morto pelos bandeirantes.
Não houve o extermínio nem captura total dos habitantes, pois muitos escaparam e se refugiaram, internando-se em regiões mais remotas, em comunidades menores. O governo julgou não valer a pena gastar com novas expedições para erradicar esses núcleos residuais, o que permitiu a sua sobrevivência.
Cabe ainda registrar que, no município alagoano de União dos Palmares, situado na mesma Serra da Barriga, a 70 km de Maceió, foi criado em 2007 o Parque Memorial Quilombo dos Palmares, um parque temático sobre a história do quilombo.
O maior de todos foi o Quilombo dos Palmares, situado na serra da Barriga, no atual estado de Alagoas. Este povoamento existiu por mais de um século.
No fim do século XVI, as aldeias que formavam Palmares ocupavam uma área de palmeirais que se estendia do cabo de Santo Agostinho, em Pernambuco, até a atual cidade de Penedo, às margens do Rio S. Francisco, no estado de Alagoas.
Por ocasião das invasões holandesas do Brasil (1624-1625 e 1630-1654), muitos proprietários de terras fugiram de suas propriedades, e os escravos aproveitaram para buscar também refúgio, não dos holandeses, mas de seus próprios senhores.
Em consequência disto, registrou-se um crescimento da população em Palmares, que passou a formar diversos núcleos de povoamento, chamados mocambos. Os principais foram:
Macaco, espécie de capital do quilombo, com cerca de 1.500 casas;
Subupira, que era o centro das atividades militares, com cerca de 800 casas;
Zumbi e Tabocas eram aldeias menores.
Historiadores estimam que, em 1670, a população local era de cerca de vinte mil pessoas.
Essa população sobrevivia graças à caça, à pesca e à agricultura. Também, havia o artesanato para consumo local: (cestas, tecidos, cerâmica, metalurgia). Os excedentes eram comercializados com as populações vizinhas, de tal forma que colonos chegavam a arrendar terras para plantio e a trocar alimentos por munição com os quilombolas. Portanto, havia um fluente intercâmbio comercial entre o quilombo e as povoações vizinhas.
Vista da linda região da Serra da Barriga, nas Alagoas, onde atualmente existe um parque temático sobre o quilombo. (Foto: Google Earth)
Outros historiadores apontam para a possibilidade de uma descentralização do poder entre os diferentes grupos, pertencentes à diversas etnias que formavam os núcleos de quilombos, que delegariam esse poder a lideranças militares, conforme o seu prestígio. As lideranças mais notáveis foram Ganga Zumba e seu sobrinho, Zumbi. Como de costume na África, havia a discriminação entre as tribos e a prática da escravidão.
Com a expulsão dos holandeses do nordeste do Brasil, voltaram os senhores de terras a ocupar suas propriedades originais, e houve a retomada de produção dos engenhos de açúcar da região. Dado o elevado preço de novos escravos africanos, o governo colonial foi pressionado pelos senhores de engenho a atacar Palmares, visando a recaptura de seus integrantes.
Em carta à Coroa Portuguesa, um Governador-geral reportou que os quilombos eram mais difíceis de vencer do que os holandeses.
Foram necessárias, ao todo, cerca de dezoito expedições, organizadas desde o período de dominação holandesa, para erradicar definitivamente o Quilombo dos Palmares.
No último quarto do século XVII, o líder do quilombo era um rei chamado Ganazumba, que no dialeto kimbundu significa "grande senhor". Mas entre os portugueses, acabou virando "Ganga Zumba". Ganga Zumba tinha as prerrogativas de um verdadeiro rei africano, com toda uma infraestrutura de apoio e criadagem inerentes ao seu cargo. Em 1677, Fernão Carrilho, enviado pelo governador de Pernambuco, ofereceu a Ganga Zumba um tratado de paz, que na verdade era bem desvantajoso para os quilombolas. Por seus termos, era oferecida a liberdade aos nascidos no quilombo, assim como terras inférteis na região de Cocaú, desde que passassem a ser devolvidos os escravos fugitivos que procurassem refúgio na comunidade. Este acordo na realidade não fora autorizado pelo governador, e sim proposto por iniciativa de Carrilho. Mas, foi aceito por Ganga Zumba, que chegou a enviar seus três filhos e doze de seus chefes menores ao Recife, onde foi feita a celebração. Porém, na realidade, a maioria dos quilombolas rejeitou os termos desse acordo, inclusive porque tirava a chance de fuga de parentes ainda escravizados. Houve forte dissidência e Ganga Zumba foi envenenado, subindo ao poder o seu irmão, Ganga Zona, moderado e aliado dos portugueses. O acordo foi rompido, e os os dissidentes acabaram dando um golpe e assumindo o poder em Palmares, colocando no trono Zumbi, filho de Ganga Zona.
Zumbi fora capturado ainda menino, durante uma incursão de Brás Rocha Cardoso contra o quilombo, e entregue ao padre católico Antonio Mello, que o batizou com o nome cristão de Francisco. Ele foi criado, alfabetizado e educado na paróquia de Porto Calvo, aprendendo inclusive latim, e tornou-se coroinha nos serviços religiosos.
Mas, com pouco mais de 15 anos, fugiu e retornou à suas origens, reencontrando seus parentes no quilombo. Lá, logo se destacou pela sua iniciativa e por seus conhecimentos, acabando por liderar os dissidentes que derrubaram seu pai.
No primeiro momento, Zumbi substituiu a estratégia de defesa passiva pela guerrilha, com a prática de ataques de surpresa a engenhos, libertando escravos e apoderando-se de armas, munições e suprimentos.
Após várias investidas infrutíferas contra Palmares, o governador e Capitão-general da capitania de Pernambuco, Caetano de Melo e Castro, contratou o bandeirante Domingos Jorge Velho e o Capitão-mor Bernardo Vieira de Melo para erradicar de vez a ameaça dos escravos fugitivos na região.
O quilombo passou a ser atacado pelos bandeirantes que, mesmo experientes na guerra de extermínio contra os índios, tiveram grande dificuldade em vencer as táticas dos quilombolas, melhor organizados que os indígenas. Além disso, não foram bem recebidos pelos colonos da região, vítimas de saques dos bandeirantes em diversas ocasiões.
Em janeiro de 1694, após um ataque frustrado, as forças dos bandeirantes iniciaram uma campanha vitoriosa, com um efetivo de seis mil homens bem armados, apoiados inclusive com artilharia.
Um quilombola, Antônio Soares, foi capturado e torturado, até que, mediante a promessa de Domingos Jorge Velho de que seria libertado, revelou o esconderijo do líder.
Zumbi foi finalmente encurralado e morto em uma emboscada, em 20 de novembro de 1695.
A cabeça de Zumbi foi cortada e conduzida para Recife, onde foi exposta em praça pública, no alto de um mastro, para intimidar os escravos que pretendessem fugir.
Sem a liderança militar de Zumbi, o quilombo se desfez, no ano de 1710.
Entretanto, sobreviventes se reuniram em comunidades menores e mais discretas, e algumas delas existem até hoje, habitadas por descendentes dos quilombolas originais. Cajá dos Negros, no município de Batalha, no estado de Alagoas, é uma delas.
A constituição brasileira de 1988 estabeleceu, no seu artigo 68, Título X, que tais descendentes tem o direito de posse das terras que ocupam, nos seguintes termos:
TÍTULO X
ATO DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS
Art. 68. Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos.
É interessante notar que:
Mesmo nos quilombos, havia a prática da escravidão de membros de etnias diferentes, costume trazido da África, onde até hoje ainda há hostilidade entre tribos.
Ao contrário do que diziam lendas antigas, Zumbi nunca foi escravo, nem se suicidou, mas nasceu livre e foi morto pelos bandeirantes.
Não houve o extermínio nem captura total dos habitantes, pois muitos escaparam e se refugiaram, internando-se em regiões mais remotas, em comunidades menores. O governo julgou não valer a pena gastar com novas expedições para erradicar esses núcleos residuais, o que permitiu a sua sobrevivência.
Cabe ainda registrar que, no município alagoano de União dos Palmares, situado na mesma Serra da Barriga, a 70 km de Maceió, foi criado em 2007 o Parque Memorial Quilombo dos Palmares, um parque temático sobre a história do quilombo.
Bonito teu resumo desse importante evento da História que costuma ser "esquecido" pelas escolas. O "Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil" de Leandro Narloch, concorda com os fatos que você narra, prova que mais de uma fonte são detentoras de versões que diferem da história "oficial". Parabéns pelo resgate.
ResponderExcluir- O zé-povinho, seja no quilombo ou na metrópole, seja hoje ou em quaquer outro século, não respeita contratos sociais: curva-se às imposições do poder.
ResponderExcluir- Abraços, e parabéns pelo belo texto.
OI!!!!!!!!!!! Gostei do que li. Obrigada pela uma visita no blog. Abraços e apareça sempre que quiser.
ResponderExcluirQue bacana ler aqui sobre parte importante da nossa história, principalmente tendo se passado aqui na minha terra amada e sofrida. Muito bem feito seu relato, Leonel, o que não me surpreende.
ResponderExcluirEsse parque localizado na Serra da Barriga já foi visitado por alunos da escola em que trabalho. Interessante os alunos poderem conhecer a história exatamente aonde os fatos aconteceram...
Minha irmã trabalha numa escola quilombola, aqui na minha cidade. Os projetos são interessantes,dispõem de mais verbas do que as outras escolas públicas, mas pra variar esbarra na burocracia. Há tempos estão tentando comprar um terreno para colocar de pé uma escola dos sonhos, que por enquanto é apenas um projeto. Verbas existem. O que falta? Melhor nem continuar comentando, né?
Beijos.
Tranquilizante saber que passei pelo crivo de pessoas deste nível de informação, e até de quem vive na região!
ResponderExcluirObrigado a todos!
Um relato importante de nossa história, pela sua bela narrativa. Bjs
ResponderExcluirLeonel, amado!
ResponderExcluirVou assinar embaixo do comentário do Rodolfo (pode?). Estou seguindo sua sugestão: "devagarinho para não quebrar o encanto"!(ADOOOOREI).
Beijuusss ILUMINADOS n.c.
Rê
www.toforatodentro.blogspot.com