FRASE:

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"Se deres um peixe a um homem, vais alimenta-lo por um dia; se o ensinares a pescar, vais alimenta-lo a vida toda."

(Lao-Tsé, filósofo chinês do séc. IV a.c.)

terça-feira, 13 de julho de 2010

POR ARES NUNCA DANTES VOADOS

Quem cruzou o Atlântico pelo ar pela primeira vez? Quem pensou em Lindbergh errou! Os autores desta façanha foram Carlos Viegas Gago Coutinho e Artur Sacadura Freire Cabral, dois intrépidos portugueses, em 1922.
Mas, quem eram esses pioneiros lusitanos hoje tão pouco conhecidos no Brasil?


Os Personagens

Carlos Viegas Gago Coutinho (1869-1959) - Oficial da Marinha Portuguesa, historiador, matemático e geógrafo. Desenvolveu um novo tipo de sextante, e, juntamente com Cabral, criou um instrumento denominado Corretor de Rumos Coutinho-Sacadura, para calcular a deriva em voo causada pelo vento. Estes instrumentos foram testados com sucesso numa viagem de Lisboa até a Ilha da Madeira em 1921. O sextante foi apresentado no Congresso Internacional de Navegação Aérea, realizado em Paris, de 15 a 25 de Novembro do mesmo ano, onde foi aprovado.
Autor de trabalhos geográficos e históricos, principalmente sobre as navegações portuguesas: Tentativa de Interpretação Simples da Teoria da Relativa Restrita; O Roteiro da Viagem de Vasco da Gama e a sua versão nos Lusíadas; Passagem do Cabo Bojador; Influencia Que as Primitivas Viagens Portuguesas à América do Norte Tiveram sobre o Descobrimento das Terras de Santa Cruz; etc...

Artur Sacadura Freire Cabral (1881-1924)
Oficial e aviador da Marinha Portuguesa. Em 1905, foi enviado para fazer um levantamento hidrográfico em Moçambique. Em 1907, chegou àquela possessão portuguesa uma missão geodésica comandada por Gago Coutinho. Os dois trabalharam em tarefas correlatas de 1907 até 1910, quando tiveram oportunidade de trocar experiências e trabalhar em conjunto.

O Sextante

A tarefa de fazer medições precisas de posição em voo com um sextante comum apresentava problemas de natureza instrumental e metodológica. Um deles era a definição da linha do horizonte nas atitudes normais de um voo.
Para resolver o problema de medir a elevação de um astro sem um horizonte de mar visível, Coutinho concebeu o primeiro sextante com horizonte artificial para ser usado a bordo de aviões. Este instrumento permite visualizar um horizonte artificial através de um nível de bolha de ar e é dotado de um sistema de iluminação elétrica, para medições noturnas. Coutinho continuou aperfeiçoando o instrumento até 1938, quando veio a ser fabricado e comercializado pelo construtor alemão C. Plath , vindo mais tarde a ser chamado “System Admiral Gago Coutinho”.

A Viagem

Em 1919, quando comandava o Centro de Aviação Marítima de Bonsucesso, em Portugal, Sacadura Cabral convidou Gago Coutinho para realizar por via aérea o mesmo percurso que Pedro Álvares Cabral fizera em 1500. Aproximava-se o ano de 1922, quando aconteceriam no Brasil as comemorações do centenário da independência. A idéia foi apresentada ao Ministro da Marinha, que aprovou. Mas, para isso,era necessário um avião capaz de voar pelo menos 1200 milhas, entre Cabo Verde e a ilha Fernando de Noronha.
Nesta ocasião, a Marinha Portuguesa planejava adquirir alguns aviões para utilizar como torpedeiros e acabou optando pelo hidroavião monomotor inglês Fairey IIID, equipado com motor Rolls Royce Eagle VIII de 375 hp.
Uma das aeronaves era um modelo especial, chamado Transatlantic F-400, com maior envergadura e autonomia do que as aeronaves padrão deste tipo, encomendado especialmente por Sacadura Cabral para a travessia. Os dois tripulantes ficavam lado-a-lado. Este avião foi batizado como Lusitania.
Com Coutinho como navegador e Cabral como piloto, iniciaram a travessia em 30 de março de 1922, partindo de Lisboa com destino a Las Palmas, nas Ilhas Canárias. A segunda etapa iniciou-se no dia 2 de abril com destino a São Vicente, no Arquipélago de Cabo Verde. De lá, no dia 18, apoiado pela canhoneira Bergo e pelo cruzador República, o hidroavião decolou de Porto da Praia, na Ilha de Santiago, rumo aos Penedos de São Pedro e São Paulo, já em águas brasileiras, a nordeste de Fernando de Noronha. Porém, ao pousar no mar agitado, o Lusitania perdeu um dos flutuadores e afundou. Coutinho e Cabral foram recolhidos pelo cruzador da Marinha Portuguesa, que os conduziu até Fernando de Noronha. Apesar de tudo, os aviadores comemoraram a precisão da rota até aquele ponto em pleno Atlântico Sul, usando os instrumentos de navegação desenvolvidos por eles.
Em Noronha, receberam até um telegrama de felicitações de Santos-Dumont.
A Marinha Portuguesa enviou, pelo navio brasileiro Bagé, uma segunda aeronave Fairey IIID, o F-401, que fora modificado para ter a mesma envergadura aumentada do F-400. Porém, logo após a decolagem, houve uma pane no motor e eles caíram novamente no mar, perdendo mais um avião.
Finalmente, um terceiro Fairey IIID, o F-402, chegou a F. De Noronha a bordo do cruzador português Carvalho Araújo e foi neste avião, batizado Santa Cruz, que os aviadores portugueses finalmente partiram de Noronha em 5 de junho de 1922, e com escalas em Recife, Salvador, Porto Seguro e Vitória, chegaram em 17 de junho de 1922 ao Rio de Janeiro, onde foram recebidos com honras e muita festa.


Com um total de 60 horas e 14 minutos de voo, eles haviam percorrido a distância de 8.383 km.
Sacadura Cabral morreu no mar do Norte, num acidente aeronáutico, em novembro de 1922, quando voava de Amsterdã para Lisboa. Seu corpo nunca foi encontrado.
Gago Coutinho morreu de causas naturais em 1959, um dia após ser promovido a almirante.
Em tempo: Lindbergh foi o primeiro a fazer a travessia sozinho e sem escalas, e no sentido América-Europa, cruzando o Atlântico Norte, em 1926.

4 comentários:

  1. Existe uma réplica em bronze na escala 1 x 1 do F-402 em Lisboa, a margem do Tejo, próximo a Torre de Belém. Lugar lindo muito visitado por turistas de todo o mundo, inclusive por portugueses. Pois bem, estávamos minha mulher e eu turistando pela área, apreciando e fotografando o avião quando notei alguns portugueses fazendo o mesmo. Cá com meus botões pensei: Será que isso dá uma piada? Em voz alta observei, com o ar mais inocente possível: Como eles conseguiam voar com um avião tão pesado assim? Um português, nitidamente pensando que se tratava de um brasileiro "vurro", replicou: Não vês que é apenas uma réplica?, o avião verdadeiro não mais existe! Ficou invocado comigo por ser tão inocente, tão ingênuo.

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  2. - Mapas em projeção azimutal equidistante ilustram bem a dificuldade que os dois portugueses tiveram: as rotas transcontinentais do Atlântico Sul são bem mais longas que as do Atlântico Norte, utilizadas por Lindbergh. Um grande feito, sem dúvida.
    - Bela matéria, Leonel. Um abraço.

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  3. É, Jair, uma das coisas que mais diferenciam os brasileiros dos portugueses é o senso de humor.
    Tem uma foto muito boa deste monumento de bronze em:
    http://thebestoflagos.blogspot.com/2008/10/lisboa-belm_8249.html
    Eu consultei alguns sites portugueses e, pelo que me consta, o avião que se encontra no Museu da Marinha, em Lisboa, é o autêntico F-402 Santa Cruz mesmo, que portanto, ainda existe.

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  4. Impressionante! Como muitos fatos da história são negligenciados e até esquecidos, deixando muitos na ignorancia. Bjs

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