Quinta-feira,
28 de fevereiro de 2013...
Preso a
um leito, tento coordenar os pensamentos e aproveitar de alguma forma
este tempo irremediavelmente devotado às agulhadas nas veias, nos
dedos e no cérebro; sim, no cérebro, porque a expectativa de ser
espetado é o uma das coisas que mais me incomoda.
Desconectado
(não consegui obter a senha de nenhuma das redes locais da clínica
e a péssima recepção local de 3G me desencorajou a assinar algum
serviço deste tipo), só me resta escrever divagações para
posterior publicação, se for o caso...
Na imagem
cheia de chuviscos de uma velha TV CRT de 14 polegadas, vejo que o
ex-papa Bento XVI foi acompanhado por toda a mídia televisiva em seu
caminho aéreo para a residência onde ficará o resto do seus dias
após a renúncia. Este foi o assunto de fundo de todos os
noticiários e transmissões extras.
Eu fui
educado em uma escola paroquial, onde o catecismo valia nota, assim
como a presença na missa aos domingos. Fiz a primeira comunhão e
segui assim até ao primeiro ano do ginásio, após o qual fui
estudar num colégio particular onde a diretoria, a maioria do corpo
docente e discente era formada por judeus. Lá nunca fui questionado
com relação as minhas convicções religiosas e nem nada me foi
perguntado a respeito.
Aos
poucos, minhas atividades religiosas passaram a se resumir ao
comparecimento à casamentos, enterros e missas de sétimo dia,
sempre acompanhando a família.
De alguma
forma, a falta de respostas à algumas questões fundamentais e a
solidez de certos dogmas inexplicáveis (e inaceitáveis) me afastou
ainda mais da paróquia e passei a procurar respostas em outras
filosofias.
Hoje me
pergunto qual diferença faz para mim o fato de um papa renunciar.
Não
quero desrespeitar as pessoas que se importam com essas decisões,
tomadas na cúpula de uma doutrina religiosa.
Mas, acho
que, nos últimos quarenta anos, nenhuma decisão da minha vida foi
tomada em função de algum ato papal. Com todo o respeito, eu
mentiria se dissesse que a renúncia de Bento XVI alterou alguma
rotina da minha vida.
“Rezar
e refletir”, foram as palavras de Bento XVI/Ratzinger para
descrever sua proposta em relação às suas atividades pós-papado,
afirmando também que não deverá interferir na gestão de seu
sucessor. Bom exemplo para ex-governantes do nosso país.
E um bom
exemplo de atitude, que também pretendo seguir: rezar para daqui
para diante não cometer tantas besteiras como as que já fiz, e
refletir sobre as tantas besteiras que cometi e disse (como algumas
acima).
Outro
exemplo: por que, quando tenho todo o tempo do mundo e os meios para
realizar alguma atividade, não o faço, e quando fico impedido de
fazer qualquer coisa como agora, fico lamentando por isto?
Será que
só sinto a necessidade de fazer algo quando estou impossibilitado de
fazê-lo?
Será que
isto ocorre com todo o mundo ou só com preguiçosos e acomodados
como eu?
Estou
ansioso por levantar desta cama, andar uns quatro quilômetros com
minha cachorra, preparar um canteiro para reiniciar minha horta no
fundo do quintal, contratar a pintura de meu quarto e dos muros da
casa, consertar a chaminé da churrasqueira, arrumar a minha
oficina/depósito e descartar no lixo quase um caminhão de coisas
inúteis que estão há anos sem serem utilizadas, usar minha
experiência para ajudar alguém a superar algum problema, enfim
fazer um sem-número de coisas menos relevantes, mas necessárias.
Será que
farei mesmo estas coisas quando estiver em condições?
A
pergunta que não quer calar...
Já estou em casa outra vez, e resolvi publicar este texto, escrito há dias atrás...