FRASE:

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"Se deres um peixe a um homem, vais alimenta-lo por um dia; se o ensinares a pescar, vais alimenta-lo a vida toda."

(Lao-Tsé, filósofo chinês do séc. IV a.c.)

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

HISTÓRIA: LIONEL CRABB, UM MISTÉRIO DA GUERRA FRIA

Nos anos 50, eu li com interesse uma reportagem na revista “O CRUZEIRO” sobre os misteriosos acontecimentos envolvendo o desaparecimento de um herói britânico da II Guerra, o homem-rã Lionel "Buster" Crabb, quando ele, supostamente em missão do serviço de espionagem britânica MI5, mergulhava sob o casco do cruzador soviético Ordzhonikidze, ancorado no porto inglês de Portsmouth.

O cruzador Ordzhonikidze conduzira o primeiro-ministro e o presidente russo para uma conferência com o premier Anthony Eden e foi alvo de espionagem pelos britânicos em Portsmouth. Mas, ao que parece, os soviéticos eliminaram o espião. (foto: Daily Mail).

O navio viera em missão diplomática da União Soviética, conduzindo o então presidente Nikita Khrushchev e o primeiro-ministro Nicolai Bulganin para uma conferência com o premier britânico Anthony Eden e seu ministério.

Khrushchev e  Bulganin: convidados pelos britânicos, tiveram seu navio espionado pelo serviço secreto naval e protestaram.

O incidente, em abril de 1956, causou um embaraço diplomático, com os russos acusando os britânicos de tentativa de espionagem no navio soviético.
Mas, esta questão ficou no ar, e eu ocasionalmente, ouvia falar do assunto, mas sempre envolto em mistério e sem nenhuma conclusão.
Crabb foi um herói condecorado na II Guerra, e tinha ligações com os serviços militares de inteligência. Ele já havia sido condecorado por seu trabalho na remoção de minas de navios britânicos em Malta e por outras missões e recebeu a Ordem do Império Britânico por sua atuação junto à esquadra italiana, em Livorno, na Itália.
Após a guerra, em 1947, ele deu baixa da Marinha Britânica e passou a mergulhar por conta própria, mas sabe-se que ocasionalmente era chamado a executar missões em caráter sigiloso para a inteligência naval britânica.
Essas atividades teriam inspirado Ian Fleming, que também era membro do órgão, na criação do personagem James Bond, o agente 007, particularmente na aventura Thunderball.
 As aventuras de Crabb na II Guerra e na Guerra Fria inspiraram Ian Fleming na criação do personagem James Bond, o famoso agente 007 vivido nas telas por Sean Connery e outros atores.

Em 17 de abril de 1956, Crabb se registrou em um hotel em Portsmouth, junto com um certo Sr. Smith (que se acredita ter sido um oficial da inteligência naval do MI5).
Eles sairam do hotel em 19 de abril e Crabb jamais foi visto de novo. Smith voltou, apanhou as coisas de ambos, pagou a conta e sumiu.
Pouco menos de 14 meses depois do desaparecimento de Crabb, em 9 de junho de 1957, o corpo de um homem em traje de homem-rã foi encontrado boiando ao largo da illha Pilsey. Estava sem a cabeça e as mãos, o que na época tornava impossível sua identificação. Nem a ex-esposa Margaret nem a namorada de Crabb, Pat Rose, foram capazes de identificar positivamente o corpo. Um ex-parceiro de mergulho, Sydney Knowles, registrou que o corpo tinha uma cicatriz no joelho esquerdo semelhante à Crabb. A comissão formada para investigar o caso deu como conclusão que o corpo era mesmo de Lionel Crabb.

 Para Sydney Knowles, quem matou Crabb foi o MI5.

Mas, em março de 2006, Tim Binding publicou um artigo no jornal Daily Mail, com o título: BUSTER CRABB FOI ASSASSINADO – PELO MI5. Binding também publicou um livro de ficção baseado na vida de Crabb, intitulado MAN OVERDOARD, publicado em 2005. Ele afirmou que, logo após a publicação do livro, foi contatado por Sydney Knowles, então morando em Malaga, na Espanha, e que ele declarara que o MI5 soubera que Crabb tinha intenções de passar para o lado dos russos. Ele disse acreditar que, sendo Crabb um herói de guerra, a publicação de tais fatos seria desmoralizante. Então, a atividade junto ao Ordzhonikidze seria apenas um pretexto, e um novo parceiro fora enviado junto com Crabb, com a missão de elimina-lo.

 Diversos livros foram inspirados nos feitos e nas
misteriosas circunstâncias do desaparecimento de Crabb.

Knowles também afirmou que fora pressionado a reconhecer o corpo como o do seu colega, mesmo convencido do contrário.
Mais tarde, Knowles relatou ter sido ameaçado de morte em após manter este contato com Binding.
(E aqui ficam minhas dúvidas: então por que não fizeram o serviço direito e sumiram com o corpo, para alimentar as hipóteses de que ele fora mesmo capturado e deixa-lo eternamente desaparecido? E, se como diz Knowles, o corpo não era de Crabb, de quem seria?)
Oficiais ligados ao almirantado britânico deixaram transpirar que Crabb desapareceu quando testava um equipamento de mergulho ainda secreto, a três milhas do local onde o navio soviético estava ancorado.
Muitas hipóteses e teorias surgiram nos anos posteriores, como:
Crabb estaria vivendo na Rússia, como oficial na marinha soviética, após ter se passado para o lado dos russos;
teria sido capturado, passado por lavagem cerebral e se tornado treinador de mergulhadores soviéticos;
que ele faria parte de um grupo especial de comandos da marinha soviética, atuando no Mar Negro;
e que teria sido morto por homens-rãs russos, em torno do cruzador soviético.
Em 1990, Joseph Zwerkin, ex-membro da inteligência naval soviética, que fora para Israel após o fim da União Soviética, declarou que Crabb teria sido avistado rondando o navio russo e atingido por um atirador de elite a bordo (provavelmente, este Zwerkin estava querendo chamar a atenção, pois esta hipótese seria a mais improvável: atirar em alguém em um país estrangeiro, sem nem ao menos identifica-lo nem saber sua intenção?)
Documentos sigilosos liberados recentemente mostram que houve de fato uma campanha para encobrir o que realmente aconteceu. Sua ex-esposa Margaret Crabb teve negado um pedido de pensão, baseado na sua morte em serviço, o que implicava em certos benefícios (Crabb havia saído oficialmente da marinha britânica em 1947).
Não havia como provar, e o almirantado se negou a reconhecer, que Crabb executava missões para a inteligência naval britânica.
Alguns membros do parlamento britânico se interessaram pelo caso, e em 1961, o Comandante J.S. Kerans solicitou reabertura do caso. Em 1964, Marcus Lipton, parlamentar inglês, também tentou a mesma coisa. Ambas as propostas foram recusadas.
Porém, em 2007, numa história que mais parece saida das páginas de uma aventura de 007, o jornal britânico Daily Mail publicou uma reportagem do jornalista David Williams onde ele noticiou que um ex homem-rã da marinha soviética, Eduard Koltsov, então aos 74 anos, declarara em um documentário da TV russa que havia cortado a garganta do mergulhador britânico, quando ele aparentemente estava colocando uma mina sob o casco do cruzador russo no porto de Portsmouth.
Koltsov, na época com 23 anos, contou que recebeu ordens para investigar atividades submarinas suspeitas ao redor do cruzador russo Ordzhonikidze, que havia trazido a comitiva russa para conferências com o premier britânico Anthony Eden e seu ministério.
Na entrevista, Kolstov afirmou ter mergulhado nas águas de Portsmouth, onde estava ancorado o Ordzhonikidze, e vislumbrado as formas de um inimigo submerso.
“Vi a silhueta de um mergulhador, usando um traje leve de homem-rã, próximo a área onde ficavam os paióis de munição a estibordo do navio. Me aproximando mais, vi que ele estava fixando uma mina.”
Aos seus entrevistadores, ele mostrou o punhal que afirma ter usado para matar o mergulhador inglês, e a Estrela Vermelha com a qual foi agraciado em uma cerimônia secreta pelo seu feito.
Aos 74 anos, Koltsov explica que resolveu contar toda a história, passados 51 anos, para que antes de sua morte o mistério de Crabb ficasse esclarecido.

O ex-homem-rã russo Koltsov mostra a faca de mergulhador com a qual teria degolado Lionel Crabb, sob o casco do cruzador Ordzhonikidze, em Porthsmouth, em 19 de abril de 1956.

No ano anterior, Koltsov escrevera uma carta para um jornal, contando que fizera parte de um grupo de combate submarino chamado Barracuda, enviado para apurar atividades submarinas em torno do cruzador russo.
Nesta carta, ele não especificava quem teria matado Crabb, mas mostrou um gráfico com a descrição detalhada de como o matador mergulhou atrás de Crabb, fisgou-o pelo pé, empurrou-o para baixo e cortou sua mangueira de ar, antes de degola-lo. Segundo ele, o corpo ficou flutuando, sendo levado pela maré.
Na realidade, acredita-se que o que Crabb estaria fixando no casco seria um dispositivo de escuta e não exatamente uma mina.
A srta. Lomond Handley, na época com 61 anos, parente de Crabb, declarou: “ Acho difícil acreditar que mergulhadores soviéticos tenham cometido um assassinato em nossas águas. Simplesmente não acredito!”
“E para um membro da marinha de Sua Majestade ameaçar um navio visitante seria algo impensável. Uma explosão causaria embaraços ao nosso governo e destruiria o relacionamento entre a Inglaterra e a União Soviética, que o nosso governo tentava restabelecer.
“É possível que Crabb possa ter ido verificar se havia minas e sua tarefa fosse afastar o perigo para eles.”
Sua mãe, Eileen, era prima distante de Crabb, e muito ligada a ele.
“Ela passou a vida tentando descobrir o que aconteceu a ele, mas se viu diante de paredes intransponíveis!”
O governo só falou mentiras, e foram governos sucessivos, não apenas o daquela época. Nenhum governo jamais revelou a verdade. Isto mostra que não se pode confiar em governantes.”
Entretanto, a hipótese de que crabb teria ido ao navio russo para "afastar o perigo de minas", sem avisa-los me parece bem estranha. E quem estaria tentando explodir um cruzador russo?

Conclusões:
Na minha modesta opinião, a declaração do ex-homem-rã russo me pareceu a mais digna de crédito. Se ele viu um homem-rã hostil fixando algo no casco do navio, é bem possível que achasse difícil capturar o intruso sem luta e optasse pelo ataque letal, como fora treinado para fazer.
E, afinal, ninguém contestou o fato de ele ter recebido uma condecoração oficial por seu feito.
Porém, também não me parece lógico que os britânicos tentassem dinamitar com uma mina um navio trazendo as maiores autoridades soviéticas para uma conferência, justamente quando o objetivo do governo britânico era de aliviar tensões entre os países.
Provavelmente, ele devia mesmo era estar colocado algum dispositivo de escuta eletrônica para monitorar as comunicações do navio russo. Só que um fato destes, uma vez descoberto, também não seria menos desastroso para as relações diplomáticas.
O incidente provocou protestos russos após a história vir a público, e a reação de primeiro ministro Eden diante disto foi de muita irritação, e ele procurou deixar claro que fora uma ação não-autorizada pelo governo, numa iniciativa isolada do MI5, sem o seu conhecimento.

Mas, como falou a prima de Crabb, não se pode confiar em governantes!

9 comentários:

  1. Leonel,
    Lembro apenas levemente de ter ouvido essa história, mas não com todos os detalhes da tua postagem. Realmente, a conclusão que você chegou parece a mais coerente mesmo, o governo da Inglaterra não seria idiota em explodir um navio russo que aportou em suas águas, seja naquela época ou hoje. Gostei do texto e fiquei mais informado de algo bem interessante sobre a guerra fria. Abraços, JAIR.

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  2. Como sempre aprendendo por aqui. Não conhecia nada dessa história digna dos melhores livros e filmes de espionagem, como tb dos serviços de inteligência. Fiquei numa gastura de imaginar o homem sendo decepado...aff Achava que poderiam identificá-lo (ex-mulher e namorada)em partes restantes rsrs.
    Beijuuss n.a.

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  3. Teorias conspiratórias proliferam quando fatos como esse são mal explicados. Talvez seja exatamente essa a intenção das autoridades.
    Abraços.

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  4. Não conhecia também a hoistória amigo. Quando vc citou o termo paredes intransponíveis, lembrei daquele presidente brasileiro suicidou dizendo estar sendo pressionado por forças ocultas....de qualquer forma sempre interesses de poder manobram de forma camuflada muitas coisas ...por isso Leonel o fato de não confiarmos mais em governantes.....hum!
    Valeu!
    Bjos
    Bjos

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  5. Tu seria um grande roteirista, guri. Adoro esse seu jeito de informar, dando sempre ao leitor várias possibilidades de interpretação. Bacaninha mesmo.

    Também sou do time que não conhecia a história, mas me fiz aluninha comportada aqui.

    Beijo, Leonel.

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  6. A gente vem aqui Leonel e aprende sobre história, a política tenta nos embaraçar com interesses escusos amigo e até consegue....kkkk ....desculpa....mas acima de tudo a gente adquire mais conecimentos e cultura é claro.
    Com uma excelente narrativa que é uma revisão bibliográfica a gente vai esclarecendo muitos pontos, enquanto o mistério permanece.
    Curioso saber que foi o seu quase xará Lionel Crabb que teria sido o inspirador do Fleming, na criação do personagem James Bond, o agente 007.
    Parabéns pela capacidade de síntese e por trazer à tona assuntos que viajaram em um Cruzeiro e chegaram até nossos dias...lembro-me que meu avô comprava todos os números da tal revista tão importante na época e que mostra continuar como parte fundamental da história.

    Obrigada pela aula de história extra!!!!

    Beijos!!

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  7. Um dia, se Deus quiser, saberemos tantas histórias que você nos terá contado Leonel....

    Parabéns!

    ;D

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  8. Um grande mistério uma grande história acho que esse nunca vai ser desvendado totalmente mas a versão do mergulhador Russo parece a mais coerente! Sugerindo uns temas para uns próximos posts Triangulo das Bermudas, Eram os deuses astronautas e area 51...

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  9. interessantissímo. histórias de guerra são sempre boas de se ouvir, isso porque estamos falando de herois reais como este. Voltarei mais vezes. Forte abraço, e até.

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