Eu adoro futebol. Joguei minhas peladas, na minha adolescência cheguei a bater uma bolinha em times amadores de futebol e futsal (naquele tempo, chamava-se futebol-de-salão) e frequento estádios desde que meu irmão me levou pela primeira vez a um deles, acho que com cinco anos.
Hoje, acompanho o futebol mais pela TV do que pelas ocasionais idas aos estádios.
Entretanto, não consigo ver com entusiasmo a realização da copa do mundo de 2014 no Brasil. Para mim, parece mais o pai duma família cujos filhos passam fome, se vestem mal, estão doentes e sofrem com diversas necessidades, se propondo a patrocinar uma festa para a vizinhança!
Com os preparativos em relação à copa, acontece um fenômeno parecido com o carnaval: nas semanas que antecedem o carnaval, a gente vê pessoas de poucas posses e natureza simples, declarando que passa noites trabalhando voluntariamente, até sem remuneração, para preparar as fantasias! Não posso deixar de pensar que, se fizessem o mesmo durante o ano, em alguma atividade lucrativa que dependesse de um empenho assim, provavelmente estariam bem melhor de vida!
Pois com a copa, a coisa é parecida, mas, em uma escala astronomicamente maior! Vemos bilhões e mais bilhões surgirem, inclusive em verbas públicas, para a construção e reformas de estádios, e uma mobilização nunca vista de governadores e prefeitos, visando a aprovação de projetos relacionados com a Copa 2014. Que tal se tivessem essa mesma disposição em cuidar da educação e da saúde públicas?
Ah, mas certamente não virão aviões cheios de turistas para aplaudir crianças bem preparadas, escolas de qualidade, nem emergências de hospitais bem equipadas, sem pessoas jogadas pelo chão ou sentadas nas calçadas! Isto não dá ibope!
Alguns dos estádios que estão sendo construídos ou reformados provavelmente terão suas maiores platéias durante a copa, e depois nunca mais serão vistos com sua lotação completa, a julgar pela média de público durante jogos do campeonato brasileiro, nas cidades onde estão localizados.
Em abril deste ano, um relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) assinalou que os estádios de Brasília, Cuiabá, Natal e Manaus correm o risco de não gerar lucros sequer para cobrir sua própria manutenção, após a realização da Copa.
O relatório também fez referência ao estado dos aeroportos, ao destacar que as obras haviam começado apenas no de Guarulhos, em São Paulo, e no do Rio de Janeiro.
O BNDES abriu uma linha de crédito para os estados onde há cidades-sede da Copa 2014, num montante total de 4,8 bilhões de reais. O teto máximo para cada cidade é de 400 milhões. Entretanto, até agora apenas três estados foram aprovados para sacar alguma coisa. Outros solicitantes tem problemas com a documentação exigida. E os totais liberados pelo BNDES são bem reduzidos, em função destas indefinições.
O perpétuo presidente da CBF declarou no início da campanha para sediar a copa que “não seria investido dinheiro público nas obras de estádios”. Mas, nos contratos firmados pela PPP (Parceria Público-Privada), ficou estabelecido que 60% dos custos com construção e reformas de estádios seriam de responsabilidade dos estados onde ficariam as sedes da competição.
Segundo alguns órgãos de imprensa, na realidade há mais dinheiro público envolvido indiretamente, por conta de verbas gastas pelas prefeituras e de partes de empréstimos empregados nestas obras.
As exigências da FIFA para a copa não se resumem aos estádios, mas também às áreas adjacentes aos mesmos, à infraestrutura de transportes e aos aeroportos. E o custeio destas obras cabe exclusivamente aos estados onde se localizam as cidades-sede.
Os argumentos a favor dos gastos públicos com a Copa do Mundo no Brasil dizem que o certame trará empregos, aumentará o fluxo turístico, promoverá a revitalização de áreas urbanas e garantirá “investimentos de peso” no país.
Segundo a Delta Construção, uma parte da estrutura auxiliar
de sustentação dos dutos de ar condicionado cedeu, na obra
do novo terminal de Guarulhos.
(Foto:Sidnei Barros/Folha Metropolitana)
Em 12 de setembro de 2011, as obras à iniciadas no aeroporto de Guarulhos foram interditadas por solicitação do Ministério Público, por não terem sido licitadas.
Para a juíza Louise Vilela Filgueiras Borer, que acolheu a solicitação do MP em caráter liminar, a dispensa de licitação não é justificável porque a necessidade da ampliação do aeroporto é antiga, e a possível situação de caos aéreo tem origem na "inércia da própria Administração Pública".
Mas, dois dias depois, a Advogacia Geral da União e a Infraero conseguiram autorização para continuar as obras.
Aliás, este é uma dos estratagemas que se costuma ver com frequência no buraco negro das obras públicas deste país: as “autoridades” vão deixando as providências que lhes cabem sem definição, até os prazos se esgotarem e as situações virarem emergências. Quando a situação é de caráter emergencial, então as obras podem ser contratadas sem licitação, e eles podem fazer o que bem entenderem, favorecendo a quem quiserem!
Neste caso, mais uma vez deu certo!
As obras do Maracanã também sofreram paralisações devido à greves dos operários por mais segurança, e os custos previstos subiram de 705 para 936 milhões de reais, devido à necessidade de demolição da cobertura, que inicialmente se julgou que poderia ser aproveitada.
Há cinco dias atrás, houve o desabamento de uma ala inteira de telhado nestas obras da expansão do aeroporto de Guarulhos, atingindo alguns operários da obra! Apesar disto, foi menos mal do que se acontecesse com o terminal já em funcionamento, entupido de gente!
O Congresso apresentou ontem um projeto de lei que prevê o uso de bases aéreas militares para o desembarque de turistas. O Comandante da Aeronáutica já teria dado luz verde para a proposta.
“É um sinal realmente de que os aeroportos não vão ficar todos eles prontos e todos eles modificados para os jogos da Copa”, prevê o deputado José Rocha (PR-BA).
O projeto deve ser votado na semana que vem na comissão especial da Câmara e só depois será votado no plenário. Parlamentares acreditam que a votação só será concluída no ano que vem.
Para mim, isto é um indício claro de que algo não está indo bem na preparação dos aeroportos envolvidos! Já estão procurando alternativas!
Por estas e por outras, não sinto nenhum entusiasmo com esse evento!